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GETÚLIO

Texto publicado em maio de 2014 nas minhas redes sociais e posteriormente na revista Vanilla.

Fui ao cinema nesta tarde de domingo assistir ao filme Getúlio, protagonizado com muito esmero por Tony Ramos. Vou falar primeiro sobre o filme em si e depois explico porque me senti compelido a vir escrever sobre ele.


Getúlio é um longa metragem muito bem dirigido por João Jardim. Retrata os últimos dias de vida do então presidente Getúlio Vargas em agosto de 1954. Após um atentado ao jornalista e candidato a deputado Carlos Lacerda, uma série de acusações recaem sobre o governo, principalmente à defesa pessoal de Vargas. São descobertos também vários documentos comprovando corrupção e vários outros atos ilícitos dentro do palácio do Catete. Parte dos militares começam a exigir a renúncia de Vargas e alguns ministros começam a falar de conspiração.

Tony Ramos encarna um Getúlio solitário e melancólico. Apesar de cansado e sentindo-se traído, insiste em lutar pela honra de seu nome, negando-se a renunciar, sabendo que não tem culpa de tudo que acontece à sua volta. Também fica claro que Tony Ramos não se prendeu a maneirismos, não forçou um sotaque gauchesco. Sendo assim, sua atuação teve mais fluidez, tornando o personagem mais natural.
O roteiro é bem escrito, apoiado em depoimentos e fatos, mas cuidadosamente dramático, denso, porém sem muita profundidade.
A fotografia chama a atenção. Muito bem feita, com muitos contrastes e ângulos fechados.

A direção de Jardim dá movimento ao filme. Ainda que seja uma trama densa e cheia de complicações, o filme é bem conduzido, sem ficar cansativo. Em resumo, é um filme muito bom. Mais um ponto para o cinema nacional que vem, cada vez mais, apresentando filmes maduros, bem feitos e bem desenvolvidos, sem precisar recorrer aos clichês favela, miséria e nordeste.

Me senti compelido a vir escrever aqui justamente pelo filme ser tão bom.
O cinema consegue criar mitos com muita facilidade. O perigo é que alguns desses mitos não são exatamente como mostrados na tela da sala de cinema. Neste caso, Getúlio Vargas aparece neste filme como um homem honrado e democrático, que se recusa a permitir um golpe autoritário por meio dos militares. Esta visão faz dele um verdadeiro mártir da política nacional, um homem que lutava pela liberdade do povo e pela honra do nome de sua família, chegando a se suicidar, dando sua vida ao invés da renúncia.

Só gostaria de lembrar aqui que este mesmo Getúlio Vargas nas décadas de trinta e quarenta instaurou uma ditadura violenta, fechando o congresso, censurando a imprensa e matando qualquer um que fosse contra seu governo. Vargas, nos anos quarenta, não só instaurou um regime fascista no Brasil, como flertava com o nazismo alemão e o fascismo italiano. Hitler recebeu mais de um telegrama de Getúlio e a polícia brasileira tinha conexões com a Gestapo, como ficou claro no caso de Olga Benario Prestes, que foi deportada para a Alemanha nazista mesmo sendo judia e estando grávida. A ditadura varguista que ficou conhecida como Estado Novo, foi a mais truculenta que o Brasil já viu, sendo mais severa e desumana do que a ditadura instaurada pelo golpe militar de 1964.


Em suas próprias palavras, Getúlio já havia rasgado duas vezes a constituição brasileira a seu favor antes de voltar ao governo nos anos cinquenta. Claro que Getúlio Vargas teve um lado muito bom para o Brasil, em especial ao regulamentar e dar direitos aos trabalhadores. Vargas foi o mais populista de todos os políticos que já passaram pelo governo brasileiro até hoje. Para o bem e para o mal. Portanto, acredito que este filme vem bem a calhar neste ano de eleições para nós brasileiros. Justamente para que possamos questionar quem são nossos candidatos e saber olhar para o passado destes. Indo além, olhando para o passado do Brasil, podemos ir às urnas tendo feito uma análise cuidadosa da nossa política e com a consciência tranquila.
Afinal, o passado a gente não muda. Mas o futuro…

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